
Com a pele cada vez mais lisa, as pontas dos dedos perdem as digitais, e
as linhas e traços de identidade se esfacelam (Fotos Daniel
Santini/Repórter Brasil)
Meninos e meninas têm as mãos queimadas por ácido e perdem as
digitais dos dedos no processo de quebra da castanha de caju. Mesmo após
denúncias, o problema persiste no Rio Grande do Norte.
Passado
um primeiro momento de grande arrancada na prevenção e eliminação do
trabalho infantil no Brasil, do início dos anos 1990 a meados dos anos
2000, o país enfrenta um novo desafio para manter o ritmo de queda.
Enquanto a primeira fase foi marcada pela retirada de crianças e
adolescentes das cadeias formais de trabalho, o novo desafio são as
piores formas de exploração, como o processamento da castanha, que o
poder público tem mais dificuldade de erradicar. O trabalho informal e
precário atinge especialmente os adolescentes e jovens e está
relacionado à evasão escolar e à falta de alternativas oferecidas pelo
mercado. A erradicação requer um plano com ações, metas e indicadores. E
uma ação política coordenada.
Muitos leitores ficam irritados
quando conectamos trabalho infantil ou escravo ao nosso consumo, o que
significa nos inserir como parte beneficiária da cadeia de escoamento.
Pois não deveriam. Não é culpa que se busca com a transparência da
origem dos produtos que consumimos, mas essa informação é fundamental
para pressionar governos e empresas a adotarem políticas a fim de
garantir que isso não aconteça. Afinal de contas, a ignorância é um
lugar quentinho.
A reportagem é de Daniel Santini, da Repórter Brasil,
que foi a João Camara, no Rio Grande do Norte, verificar as condições
das crianças que perdem as digitais no processamento da castanha:
Olhe
a ponta do seu dedo. Repare no conjunto minúsculo de linhas que formam
sua identidade. Essa combinação é única, um padrão só seu, que não se
repete. As crianças que trabalham na quebra da castanha do caju em João
Câmara, no interior do Rio Grande do Norte, não têm digitais. A pele das
mãos é fininha e a ponta dos dedos, que costumam segurar as castanhas a
serem quebradas, é lisa, sem as ranhuras que ficam marcadas a tinta nos
documentos de identidade.
O óleo presente na casca da castanha de
caju é ácido. Mais conhecido como LCC (Líquido da Castanha de Caju),
esse líquido melado que gruda na pele e é difícil de tirar tem em sua
composição ácido anacárdico, que corrói a pele, provoca irritações e
queimaduras químicas. No vilarejo Amarelão, na zona rural de João
Câmara, as castanhas são torradas – além de corroer a pele, o óleo é
inflamável – e quebradas em um sistema de produção que envolve famílias
inteiras, incluindo as crianças.
O óleo é pegajoso. Basta pegar uma castanha e quebrá-la para ficar com a
pele manchada por alguns dias. Nem todas as crianças e os adultos que
trabalham no processo sabem que o óleo é ácido. Muitos acham que a mão
fica assim machucada por conta da água sanitária utilizada para tirar o
preto encardido da mão depois de horas seguidas manuseando e quebrando
as castanhas torradas. “Se fosse assim, as pessoas que usam água
sanitária para limpeza estariam roubadas! É o óleo LCC que tem uma ação
irritante, ele é cáustico, produz lesões e chega a retirar as digitais”,
explica o médico Salim Amed Ali, autor de diferentes estudos sobre
doenças ocupacionais para a Fundação Jorge Duprat Figueiredo de
Segurança e Medicina do Trabalho (Fundacentro), do Ministério do
Trabalho e Emprego. A perda da identidade não é permanente. Com o tempo,
as digitais voltam se a pessoa se afastar da atividade.
Materia completa veja AQUI
Fonte:Blog do Sakamoto
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