Diego Junqueira/R7
“Eu fiquei muito triste quando descobri. Se eu não tivesse a cabeça boa, acho que já tinha morrido”. Sandra, 41 anos, há pelo menos dois anos vivendo com o HIV
Ela é uma negra bonita, de corpo sem miséria ou exagero, pronto para o samba.
- Dizem que eu pareço a Sandra de Sá.
Pois então Sandra (nome fictício), que sempre teve bom humor, conta que já bebeu, já fumou e já dançou muito. Mas, por questão de saúde, teve de parar. O cigarro e o álcool não lhe fazem mais falta. A ginga, porém, é o que tira pedaço da mulher de 41 anos. O culpado está nos olhos amarelados, nas mãos e nos pés de cor mais escura, na anemia que emperra as duas pernas e nas contas de um vírus que abriu as portas para isso tudo: o HIV.
Há um ano e meio, Sandra enfrenta uma anemia megaloblástica. Há dois descobriu que é soropositiva. E há três – talvez quatro ou cinco – possui o vírus no organismo.
Quando uma pessoa se infecta, a Aids pode levar dez, quinze, vinte anos até se desenvolver. Talvez nunca se manifeste. No caso de Sandra, a doença começou a causar problemas há um ano, quando ela sofreu uma parada cardíaca.
- Não queria que a doença atrapalhasse meu rendimento no serviço. Só que comecei a passar mal. Não sei se é porque eu fumava ou porque passava muitas noites sem dormir [ela trabalhava como ajudante geral em um buffet].
Depois da parada cardíaca e da internação de 15 dias, Sandra deu início ao tratamento com os antirretrovirais, medicamentos que dificultam a multiplicação do vírus no organismo.
Mas a terapia causou deficiência de vitamina B12, desencadeando a anemia megaloblástica. É a chamada doença oportunista, que se aproveita da Aids para se instalar.
Além disso, Sandra enfrenta outro problema conhecido como cianose, que ocorre por falta de oxigenação no sangue, deixando-o mais azulado. É por isso que a extremidade de suas mãos e seus pés tem uma coloração mais escura. Isso tudo deixou Sandra com dificuldades para caminhar, em licença-saúde no trabalho e com dormência no samba. Ela diz que a doença mudou sua vida.
- Mudou porque eu gosto de dançar e eu não consigo dançar mais. Não consigo ficar solta e tenho dificuldades para respirar. É como se tivesse chumbo nos meus pés. Fica pesado.
Álvaro
Diferente de Sandra, Álvaro (nome fictício) já superou as doenças oportunistas: uma tuberculose e uma pneumonia.
- Quando procurei o médico eu estava morrendo.
Há dois anos, as duas doenças o fizeram emagrecer 14 kg e quase o mataram. Foi quando o homem de 38 anos descobriu que tinha o HIV.
Ele diz que se infectou quando se relacionou com “uma mulher de outra cidade”. O cálculo dele – e dos médicos – é de que esteja com o vírus há mais de quinze anos.
Nesse tempo, Álvaro foi casado por uma década e teve uma filha. Nenhuma das duas sabe da doença. Eles se separaram há quatro anos e ela se casou novamente. Ele não sabe se um dia vai revelar sua condição para a ex-esposa. Ao ser questionado sobre os motivos, Álvaro hesita e diz que está "tentando tocar a vida".
- É assim: eu sinto que ela poderia ter feito alguma coisa para salvar nosso casamento. E ela não fez absolutamente nada. Isso dificulta bastante.
O homem franzino e humilde deixou para trás uma pneumonia e uma tuberculose, conseguiu a liberação dos médicos para retomar o trabalho e agora planeja uma poupança para a filha. Apesar disso tudo, Álvaro não conseguiu se afastar do rancor, que se aproveita da angústia e do medo para se instalar.
- Quando estou perto de alguém espirrando, eu já fico resfriado. Se estou perto de alguém com mau cheiro na boca, pego inflamação na garganta. Hoje eu tenho muito medo das pessoas, medo de elas me transmitirem alguma coisa.
Se Sandra, por um lado, afirma não ter medo da reação das pessoas, Álvaro teme ficar isolado. Ele tem tanto medo de uma gripe corriqueira quanto de ser desprezado.
- Não contei pra ninguém porque não quero que fiquem com pena de mim, que me tratem com desprezo, que tenham medo de me machucar. Se eu conto para a minha mulher, tenho certeza que ela vai sair espalhando. E alguns vão se afastar. Esse é meu maior medo.
Desde que descobriu a doença, Álvaro foi morar em uma casa mais perto da família.
Diz que aprendeu a gostar mais dos parentes e a não pensar só em si. Mas, para Álvaro, ficar junto é importante porque ele imagina que, em breve, já não vai mais estar.
- Eu acho que tenho pouco tempo de vida. Já vivi 17 anos com o vírus. Isso é muita coisa.
Com exceção de uma das irmãs, nenhum parente ou amigo conhece sua sorologia. Álvaro carrega o vírus quase sozinho.
- Eu preferi ficar um pouco à parte.
Do site r7.com
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